domingo, 16 de setembro de 2012

Vivamos hoje (Today we live – 1933)




Apesar de alguns misturarem os conceitos, o fato de um filme ser antigo não quer dizer que seja um clássico. Vivamos hoje, mesmo dirigido por Howard Hawks, e com os astros Joan Crawford e Gary Cooper nos papéis principais, é só um filme antigo. A excelência técnica da MGM na época, com Irving Thalberg ainda no leme, impede que o filme seja uma total perda de tempo, mas os problemas são por demais significativos para que sejam ignorados, tanto numa análise fria de hoje em dia, como no calor da época (foi um dos pouquíssimos fracassos de bilheteria de Joan Crawford nos anos 30).

Levando-se em conta que o filme é adaptado de um conto de William Faulkner, com participação dele nos diálogos (o roteiro mesmo foi escrito por Dwight Taylor e Edith Fitzgerald), o fracasso salta ainda mais aos olhos, mesmo com toda a lendária inadequação de Faulkner em Hollywood. Isso porque o próprio roteiro tem crateras lunares em sua estrutura, como o amor recorde de Diana (Joan Crawford) por Bogard (Gary Cooper, emprestado da Paramount, onde tinha contrato), o homem que compra a casa de sua família após a morte de seu pai. Em apenas uma passeada de bicicleta juntos, dois completos estranhos declaram, em tom robótico, que estão apaixonados um pelo outro. Não convencem ninguém, evidentemente, na que com certeza é das piores cenas românticas da história de Hollywood. A falta de química entre os dois também se verifica entre Diana e Claude (Robert Young), que faz com ela o triângulo amoroso básico do filme (que remete a Asas, filme bastante superior a este aqui). O mais bizarro de tudo é que no filme há sim química entre um casal, mas justamente onde não deveria haver, de Diana com seu irmão (Franchot Tone), e isso aconteceu porque foi trabalhando neste filme que Joan Crawford e Franchot Tone se apaixonaram (o que levou a um casamento pouco depois), e a tela capta isso, curiosamente. Parecia que até o destino estava atrapalhando o filme...

As cenas de aviação da Primeira Guerra Mundial são muito boas, mas isso não é mérito do filme, já que foram emprestadas de Anjos do inferno, de Howard Hughes. Howard Hawks demonstra que não estava lá muito comprometido em criar um romance entre os atores, abandonando a empreitada desde o início e só focando na guerra e no heroísmo dos personagens (o que sempre foi seu forte, o sentimento de grupo entre eles, que repetiu nos seus maiores sucessos). Joan Crawford e Gary Cooper estão bem per se, mas não ajudando um ao outro (ela já era uma estrela, ainda mais depois de Grande Hotel, onde até ofuscou Greta Garbo. Ele já estava muito perto deste status, ainda mais depois do sucesso de Adeus às armas), e nenhum ator sequer tenta adotar um sotaque britânico. Os figurinos de Adrian para Joan Crawford, apesar de muito bonitos, ignoram a época em que se passa o filme, sendo claramente dos anos 30 mesmo. Do desastre, salvam-se Franchot Tone, que tem a melhor atuação do filme, a juventude do casal principal (pena que nunca mais contracenaram juntos), a eficiente fotografia de Oliver T. Marsh e o fato da MGM, mesmo nos seus piores momentos, conseguir criar um filme de ritmo razoavelmente ágil, que não cansa o espectador (nem o faz se concentrar tanto nos defeitos do filme). Mesmo com todos esses problemas, Vivamos hoje não se interpôs no caminho de quem trabalhou nele, bem ou mal os quatro atores principais e o diretor seguiram com suas carreiras de muito sucesso. Às vezes se vê a força de um grande time nas suas piores derrotas.

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