terça-feira, 19 de julho de 2011

Antonio Gaudí (1985)


Todo mundo conhece a história de “A felicidade não se compra”, onde podemos ver o quanto seria diferente a cidadezinha sem a existência de George Bailey. Talvez fosse necessário outro anjo para nos mostrar como seria Barcelona se Gaudí nunca tivesse existido, porque é muito difícil imaginar a cidade sem ele. Sem dúvida um dos grandes arquitetos da história, Gaudí conseguiu criar construções baseadas na natureza, com formas que lembram ondas, ou galhos e raízes de árvores, de rara beleza e sem paralelo (dizem que é muito difícil até copiá-lo, de tão fora dos padrões que são as suas concepções). Gaudí foi um homem profundamente conservador, austero e religioso (a ponto de devotar boa parte do fim de sua vida na incompleta construção hiper-megalomaníaca da “Sagrada Família”) que se misturou à história espanhola, e foi sendo reconhecido aos poucos pelo mundo inteiro, com muita justiça.

Gaudí é muito conhecido e respeitado no Japão, e parte disso se deve à família Teshigahara, que o divulgou assim que tomaram conhecimento de sua vasta obra. Os Teshigaharas já tinham influência no seu país devido ao tratamento que dispensavam à Ikebana (Sofu Teshigahara, pai de Hiroshi, fundou a Escola Sogetsu de Ikebana), e com certeza souberam compreender um homem, mesmo ocidental, que sabia trabalhar tão bem de olho na natureza, como Gaudí. Hiroshi Teshigahara era, além de um ótimo diretor, com obras de impacto como “A mulher de areia” e “A face de outro”, também um talentoso pintor, escultor, diretor de óperas e de teatro. Um raro generalista numa época cada vez mais composta de especialistas, Teshigahara consegui fazer um documentário minimalista sobre Gaudí sem ser simplório, e meditativo sem ser cansativo. A sua câmera passeia pelas obras de Gaudí com competência, sem se apressar, deixando-nos descobrir ou apreciar melhor o inegável gênio capaz de criar tantas obras fantásticas.

Quem procura um filme didático, com experts em Gaudí discutindo em mesas redondas, deve procurar outra praia. O filme é praticamente mudo, e Teshigahara não se preocupa em explicar nada, talvez até porque nada exija explicação. Cada obra basta em si. Aqui a preocupação do diretor é com a poesia de cada construção, e com o estupor que elas quase sempre nos provocam. É evidente que o efeito nunca será o mesmo de vermos essas obras diretamente, fisicamente, mas há uma certa mágica ali que a direção dele, a fotografia de Hiroshi Segawa e a música de Toru Takemitsu (seus parceiros de sempre) evocam, e nos fazem posteriormente pesquisar mais e querer conhecer melhor o trabalho de Gaudí. É quase como se Hiroshi Teshigahara nos dissesse que, talvez mais importante que o conhecimento intelectual sobre uma obra artística, seria o efeito inicial, emocional mesmo, que ela nos causa.

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