sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Ruby Sparks: A namorada perfeita (Ruby Sparks – 2012)




Ruby Sparks: A namorada perfeita é um filme que sofre o impacto de expectativas destorcidas e exageradas. Isto se refere ao fato de sofrer a “maldição do segundo filme” (já que é o segundo longa do casal Valerie Faris e Jonathan Dayton), com a consequente espera de todos de que seja um filme tão engraçado e interessante como Pequena Miss Sunshine o foi (e que faça o mesmo sucesso). Mas isto igualmente vale em relação à sua própria trama. Nela o jovem escritor genial Calvin (Paul Dano) começa a escrever sobre uma garota por quem sonhou (Zoe Kazan) e logo descobre, estupefato, que ela não só passa a existir (inclusive para os outros, não é só uma miragem sua), como também a fazer e pensar tudo o que ele escrever sobre ela. Uma marionete humana capaz de, em tese, finalmente fazê-lo feliz, ele que por tanto tempo foi tão sozinho (a ponto de sequer ter amigos). O que poderia dar errado numa relação em que ele poderia controlar sua parceira em todos os seus pensamentos e atitudes?

Entretanto, Calvin logo descobre que, passado o entusiasmo inicial, aquela situação toda poderia não ser tão perfeita e promissora assim. Será que realmente tudo o que ele quer é uma mulher que o obedece em tudo? E se parar de escrever sobre ela, deixá-la seguir sua vida normal, será que ela continuaria interessada nele? O que realmente deseja Calvin, uma mulher feita sob medida para ele, ou uma que o desafie e o force a amadurecer, mesmo que com isso corra o risco de perdê-la? Ruby Sparks pode ser perfeita para ele, mas seria Calvin perfeito para ela? Seria ela capaz de escrevê-lo também? Ruby Sparks: A namorada perfeita lida com estas questões de forma surpreendente, pois a sua premissa básica em geral aponta para um filme repleto de piadas e situações inusitadas, a uma comédia mais convencional. O filme bebe de um certo tom de ironia e magia, certamente, mas prefere mais se aprofundar no romance do que no tom de comédia, o que pode decepcionar o público (e o trailer do filme não ajuda em nada isso, dando a impressão do filme ser uma comédia à la Pequena Miss Sunshine). Talvez o que ajude o filme a se concentrar mais no romance é ter dois casais no seu leme, no caso Jonathan Dayton e Valerie Faris, assim como Paul Dano e Zoe Kazan. A neta de Elia Kazan inclusive já escreveu o roteiro pensando em seu namorado Paul Dano, e isso contribuiu a se ter mais veracidade no filme (e, claro, contribuiu também a que ela mesma interpretasse o papel principal do filme, com uma carreira ainda iniciante). Há um quê de pessoal ali entre os atores, indefinível mas existente. E não deixa de ser irônico que, na vida real, foi ela quem escreveu um personagem para o namorado, para que ele vivesse de acordo com a sua imaginação...

O resto do elenco sustenta bem o casal principal, desde o irmão de Calvin (Chris Messina), sua mãe e padrasto (Annette Bening e Antonio Banderas), até o seu psicólogo (Elliott Gould). O personagem de Chris Messina e o de Annette Bening parecem pertencer mais ao universo de Pequena Miss Sunshine, mas mesmo eles no desenrolar da trama se aquietam um pouco. Esta mudança de rumo, de uma comédia anunciada nos primeiros minutos (uma espécie de Mulher nota mil refilmada), a um drama romântico no decorrer da trama, realmente puxa o tapete do público, e sente-se que o filme tateia um pouco no escuro tentando se encontrar em seu miolo. Há uma ou outra topada no meio do caminho, um escorregão aqui e ali, mas por fim o filme acha a sua voz. Com um final aberto a algumas interpretações, Ruby Sparks: A namorada perfeita pode não ser um filme perfeito, até porque os diretores e a atriz-roteirista não podem escrever a audiência perfeita, que aplaudiria o filme deles de qualquer forma, de acordo com a vontade deles (seria sensacional ter esse poder... Ou será que não teria a menor graça?). O filme é imperfeito, não é tão cômico como muitos gostariam que ele fosse, nem tão profundo a ponto de ser existencialista ou filosófico, os atores não são as beldades que boa parte do público está acostumada a ver, e as respostas, mesmo que abertas, que o enredo apresenta podem decepcionar a alguns espectadores. Mas os que permitirem que o filme reescreva suas expectativas sobre os diretores, o próprio filme, os personagens dele e, talvez o mais difícil, suas próprias fantasias e desejos pessoais, podem ter um novo olhar sobre o que há de perfeito na imperfeição.

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