terça-feira, 30 de outubro de 2012

007 – Operação Skyfall (Skyfall – 2012)




A série de 007 chega a seus 50 anos, e o peso destes anos começa a se fazer presente tanto no personagem quanto no tratamento dado a ele. De um começo pouco auspicioso em O satânico Dr. No, quem poderia dizer que James Bond estaria com esta banca toda em pleno 2012, em seu 23º filme oficial? Porém James Bond aos poucos foi alcançando o posto de ícone da Grã-Bretanha, e parece que cada vez mais o orgulho britânico fará de tudo para mantê-lo sempre de pé, custe o que custar (como inclusive provou a própria Rainha Elizabeth II, contracenando brevemente com ele na abertura das Olimpíadas de Londres). Este povo pode ter suas excentricidades, mas é fiel aos seus ícones e tradições, e James Bond parece ter se tornado um símbolo para ele tão significativo como a monarquia, os Beatles, fish and chips e o chá das cinco... Vilões, feministas e críticos já tentaram matá-lo diversas vezes, e o personagem resistiu a todos, inclusive às inevitáveis trocas de atores em sua incorporação. Resistiu até mesmo ao processo de falência da Metro-Goldwyn-Mayer, que atrasou em cinco anos a sua volta aos cinemas. E aqui está ele, firme e forte, um pouco mais velho e baleado, é verdade, mas ainda com muita lenha na fogueira para queimar.

Para 007 – Operação Skyfall, porém, James Bond recebeu uma bela de uma ajuda para voltar ao topo, neste que é um dos melhores filmes da série. Nenhum outro filme anterior teve uma equipe tão tarimbada e prestigiada trabalhando para que Bond voltasse a brilhar, depois do discreto 007 – Quantum of solace, de 2007. A começar pelo próprio diretor, Sam Mendes (oscarizado por Beleza americana, e diretor de Soldado anônimo e Foi apenas um sonho, entre outros), disparado o de maior nome para dirigir um filme de 007, até hoje. Mendes, de criação teatral, soube se adaptar muito bem ao universo de um filme de ação, e foi importante ao não entupir o filme de tiros e explosões, sabendo focar nos personagens boa parte da atenção de seu filme. Ele está muito bem acompanhado de alguns membros cativos de seus filmes, como Roger Deakins, prestigiado diretor de fotografia (de obras como Onde os fracos não têm vez, O homem que não estava lá e Barton Fink – Delírios de Hollywood) que cria algumas das mais belas imagens da série. É uma fotografia que parece até pertencer mais a um filme de arte do que a um filme de ação padrão, de tanto esmero que apresenta. A trilha sonora também é de primeira, assinada por Thomas Newman (outro renomado músico que acompanha a carreira de Sam Mendes), que imprime a sua marca e tem a inteligência de não desprezar os acordes mais famosos da trilha clássica de James Bond, criados por Monty Norman e John Barry. Esse, aliás, é o grande mérito de 007 – Operação Skyfall: Ele soube reverenciar os 50 anos da série e atrair o interesse de um público novo ao mesmo tempo, algo dificílimo de se fazer. Há uma mistura de tradição e novidade que é reconfortante e energética, trazendo de volta pequenos detalhes que trazem sorrisos na boca dos bondmaníacos (como a canção-tema de Adele no começo do filme, com belos efeitos visuais, algo que vinha sendo abandonado), sem alienar os que não são tão fissurados pelo universo de James Bond. Os dois primeiros filmes com Daniel Craig modernizaram um pouco demais a série, a descaracterizando um pouco aos olhos dos fãs, e os levando a serem considerados como quase cópias da trilogia Bourne. O que é uma bruta ironia, pois na verdade filmes como os da trilogia Bourne devem sua existência ao sucesso perene da série James Bond.

Em 007 – Operação Skyfall, Bond é mais humano e falível, e tem que compensar um pouco suas limitações físicas com experiência e inteligência. E os próprios míticos personagens M e Q são mais substanciais, e não apenas as tradicionais escadas para que Bond brilhe mais. Judi Dench, inclusive, como M, é a Bond-Lady em pessoa, neste filme muito mais importante do que qualquer Bond-girl, deixando de ser apenas a misteriosa chefe de 007 para ser parte integrante da trama (de forma até mais enfática do que já tinha feito em 007 – O mundo não é o bastante). E Q, interpretado pelo jovem Ben Whishaw, se pode incomodar aos mais puristas por sua juventude, parece muito mais antenado e crível num mundo cibernético do Século XXI. Ralph Fiennes, como um importante membro do Governo britânico, e Albert Finney, como um esquecido personagem do passado de James Bond, trazem respeitabilidade ao filme e à trama, que poucos poderiam trazer com a mesma competência. Javier Bardem está um pouco exagerado, mas isto é até desejável e adequado em um vilão de filme do 007, e suas cenas sempre trazem uma carga extra de vitalidade e perigo, demonstrando mais uma vez a importância de se ter um grande vilão. As Bond-girls é que, surpresa das surpresas, ocupam um certo segundo plano no filme. Bérénice Marlohe é lindíssima, mas tem pouco tempo em cena (talvez o único defeito do filme, pois a química entre ela e Daniel Craig é muito boa), e Naomie Harris oscila entre ser uma Bond-girl e uma Bond-friend, o que inclusive se explica ao final do filme. Quanto a Daniel Craig, este está cada vez mais confortável e estabelecido no papel central. De muito combatido na época de sua escolha para ser o novo James Bond após a saída de Pierce Brosnan, ele mostra estar absoluto no papel e pronto para seguir por mais alguns filmes. Difícil vai ser ele ter tanto sucesso no futuro como teve neste filme. Parece que 007 – Operação Skyfall vai ser para ele o que 007 contra Goldfinger foi para Sean Connery, 007 – O espião que me amava foi para Roger Moore, e 007 – O mundo não é o bastante para Pierce Brosnan. Este tem tudo para ser o seu grande momento no papel.

Não adianta, tentaram de tudo. Vilões barra-pesada, loucos e megalomaníacos, seus comparsas perigosíssimos, lindas garotas munidas de muita sedução, helicópteros, jacarés, tubarões, Guerra Fria, terrorismo, Internet, nada disso derrubou James Bond. Nem mesmo o tempo, que costuma derrubar a todos, mas não parece que vai vitimá-lo pois ele aprendeu a usar o passar dos anos a seu favor. Ele veio para ficar, e já começa a não ser tão absurdo assim imaginar ele inaugurando outro filme em 2062, celebrando seus 100 anos. Dele pode-se esperar tudo. Desde as tiradas engraçadinhas de sempre, as mulheres se jogando a seus pés, a eficiência mítica no seu serviço, as esnobadas nas ordens de seus superiores, a vodka-martini, a sorte nos cassinos, que todos já estamos acostumadíssimos a ver, até a recente limitação física, a dor, o sangue, e até algumas eventuais lágrimas. Bond se mantém e se reinventa, num filme que rivaliza com 007 contra Goldfinger, 007 – O espião que me amava e mais alguns outros como dentre os melhores da série. Aliás, com tanto esmero na sua produção, gente talentosa e experiente à frente e atrás das câmeras, um ritmo impecável e várias cenas marcantes (de ação ou apenas dramáticas), 007 – Operação Skyfall já se mostra como um dos melhores filmes de 2012, de qualquer gênero ou nacionalidade. E isso é quase inacreditável em um 23º filme de uma série de ação, que tinha tudo para ter sido sepultada há muito tempo. Mas não foi, e parece que nunca será. Além de um herói das telas, James Bond é um herói de um povo. E um povo tradicional como nenhum outro, que resistiu aos vikings, a Napoleão, Hitler e até ao fim de seu fabuloso império, onde o Sol nunca se punha. Ele não vai deixar James Bond ser esquecido, nem que tenha que passar a cantar “God save James Bond”... 

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